A TUTORIALIZAÇÃO DA VIDA!

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Sim, gosto de neologismos. Em outras palavras, tutorialização, nada mais é do que pegar vídeos na Internet para aprender algo, geralmente de forma fracionada, e tentar aprender algo. Entram neste escopo a grande quantidade de cursos sendo vendidos sobre tudo: mercado financeiro, música, culinária, teologia, etc. Não há fim para estes cursos.

É fato de que quem tem alguma habilidade encontrou um nicho bom para ganhar dinheiro e realmente ensinar estas habilidades a outras pessoas de forma eficaz, rápida e produtiva. Portanto, não é uma crítica que desconsidera as vantagens destas possibilidades que a Internet criou, mas vamos aos problemas e possíveis soluções.

Quantos de fato acompanham os cursos que compram e fazem valer o investimento feito? Não tenho dívidas de que é como a famosa academia para exercícios físicos onde a maioria paga, mas não frequenta. A academia tem culpa? Acho que não porque ela continua disponibilizando o que foi contratado. Tive a curiosidade de perguntar na recepção de uma destas academias famosas certa vez qual era o número de alunos matriculados ali. A resposta foi: em torno de 4.000 alunos. O salão, ainda que grande, não comportaria mais do que 300 pessoas treinando ao mesmo tempo, mas deixo a matemática para os experts com as seguintes questões: o ganho mensal desta academia, ainda que seus custos de manutenção também sejam altos e, como seria se os alunos realmente fossem treinar num dia mesmo que distribuídos em vários horários. Mas a questão principal ainda permanece: quem compra realmente faz?

Em segundo lugar, pouco vejo falar da efetividade dos cursos porque há, sem dúvidas também, certas limitações ao ensino em muitas áreas. Eu já acompanhei tutoriais na Internet para fazer coisas em casa como, por exemplo, algo na manutenção da casa, ou que pretendia cozinhar. É muito frustrante porque nem tudo fica tão belo quanto no vídeo. O vídeo só é postado quando houve sucesso. É claro! Mas sempre há dúvidas, há coisas que poderiam melhorar, mas a gente nem sempre sabe muito bem onde foi que errou. Por isto, qualquer coisa que nos vendam sem algum tipo de assistência pode ser considerado uma fraude. Leia as letras pequenas sempre!  

Um terceiro problema é o excesso de ofertas. Vou dar um exemplo: professores de guitarra. Há muitos. Qual escolher? Isto é um problema. Alguém poderia dizer para que se analise o estilo do professor, a experiência deste no ensino, a linguagem de guitarra que se pretende desenvolver, etc. Mesmo fechando este circuito, as possiblidades ainda são muitas. Por isto, a escolha deve ser criteriosa e, ao mesmo tempo, sujeita a frustrações e mudanças. Assim, aquele famoso ¨test drive¨ de alguns dias é sempre uma boa opção antes da escolha final. Transparência de lá, segurança de cá.  

Um quarto problema, e parece mais grave, é um certo sentimento de que você nunca vai chegar lá e se tornará, ao mesmo tempo, dependente daquela ajuda sempre, quase como um vício. Explico voltando para a questão da música. Alguns limites de virtuosismo e complexidade parecem já ter sido alcançados e há pouco espaço para o novo. E, com tanta gente boa, para que mais um? E o pior é que alguns mentem dizendo que com apenas 15 minutos diários é possível alcançar resultados incríveis, mas escondem as muitas horas diárias por anos a fio para poderem ainda agora, com justiça, diga-se de passagem, avançarem com menos esforço. Portanto, está errado quem ainda acredita em avanço e sucesso sem dedicação e inteligência.

O quinto e último, pelo menos para mim, é a sensação de que o mundo é um eterno tutorial no qual basta pagar para a pessoa certa e tudo se resolve. A própria ideia de tutor, se levada a sério, é um pouco assustadora, porque é a sujeição da nossa vida, ainda que num aspecto particular, sob o comando de alguém. Quem apela para um tutor, num certo sentido, assume que não pode ir em frente sem sua ajuda exclusiva. Apesar de parecer um pouco exagerado aqui, o exagero se presta a um fim didático. Ou seja, se alguém se comporta com um tutor, querendo assumir o controle da sua vida, ainda que de uma área específica, foge porque é uma cilada. Procure aqueles que assumem uma postura de parceria, orientação, apoio, que mostrem os limites de si mesmos e do que ensinam. Procure aqueles que falem de seus próprios fracassos e que também te vejam como um fracassado em potencial. Dramático? Talvez, mas alguém que me diga onde posso errar pode ser mais útil do que alguém que me vê como um campeão imbatível.

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