Desde pequenos somos provocados a crer ou não crer em seres que, por um lado nos ajudam a criar nossa imagem e auto imagem, por outro lado nos assombram e amedrontam, por outro lado ainda são motivo de piada, ou provocam nossa ira e revolta e, n maioria dos casos, senão no seu absoluto, são totalmente inúteis e nada didáticos. Falo do Papai Noel, da Mula sem Cabeça, do Saci Pererê, do Coelhinho da Páscoa, do Pinóquio, e de outra grande serie e personagens, heróis e vilões que preenchem nosso imaginário e que muitos gostam, ou de um ou de outro, cada geração tem seus próprios heróis e bandidos.
Mas acabamos não nos dando conta de que no mundo real (se é que existe de fato esta dicotomia entre real e irreal de modo tão tangível) ainda fantasiamos (se é que fantasiamos?) a existência de seres com super características morais e espirituais, que vivem em nosso meio. Apesar de todos os alertas e escândalos que nos rodeiam sem cessar, ainda cremos em super crentes e super pastores, mas não falo nem deles, falo de um crente mais comum (se é que é comum) e que é anunciado semana após semana e que me parece tão distante, quase incrível, quase irreal. Quem vai negar que eles possam existir, que tais sejam possíveis, ainda mesmo sendo nós mesmos ¨cristãos¨?
Não é à toa que a história é tão rica em críticos a nossa crença nestes super seres, ou supra, existenciais. Quem nunca leu, mesmo de passagem sem muita atenção, uma crítica de Gandhi aos cristãos: ¨Não conheço ninguém que tenha feito mais pela humanidade do que Jesus. De fato, não há nada de errado no cristianismo. O problema são vocês, cristãos. Vocês nem começaram a viver segundo os seus próprios ensinamentos¨ (tenho a impressão de já ter lido algo parecido, mas em outras palavras lá pelo capítulo 23 de Mateus – sei não!). Não só esta frase, mas um porção de outras você pode conseguir em uma simples pesquisa ao Grande Oráculo (Google). As críticas vão exatamente no ponto em que prometemos mais do que entregamos ou prometemos muito mais do que somos de fato capazes de entregar.
E nosso digníssimo e criticadíssimo Friedrich Nietzsche então? Suas observações, frases, textos e teses são sempre ácidas, azedas, mas sempre muito contundentes: ¨Só existiu um cristão, e ele morreu na cruz¨ – esta me comove! Ainda falando nele, vale uma observação minha: apesar de toda crítica que se faz a ele, suspeito, até por sua origem protestante, que no fundo ele tinha certa esperança de que todas as expectativas criadas pelos cristãos se concretizassem de alguma maneira em sua geração, fazendo dele, ainda sob meu ponto de vista, um sagaz e arguto observador, mas por outro lado um tolo quanto a esta mesma esperança. (Vale uma nota: não há nada que nos faça melhor do que críticas porque apontam onde temos que melhorar e apontam onde erramos. Talvez a bronca de muitos cristãos com o Nietzsche seja o fato dele quase sempre ter razão!).
Faço, então, questionamentos para os encontrarmos em algum lugar ou alhures.
Onde estão aqueles que se amam incondicionalmente e colocam sempre os outros acima de todos os preceitos e preconceitos? Onde estão aqueles que são capazes de andar mais um pouco com os que precisam, mesmo depois de esgotadas as possibilidades, e de dar, se preciso for, até as roupas do próprio corpo? Onde estão aqueles que põem sua vida espiritual acima de dinheiro, lucro, status, poder, sexo, aparência, futebol? Onde estará aqueles que, não se vendendo às formas baratas de solução facilmente ofertadas por aí, fazem do ensinamento e do modelo de Cristo sua real forma de interferir no mundo de modo positivo? Onde estão aqueles que, ao terem suas vidas observadas minuciosamente, darão sinais incontestáveis da presença de Deus, fazendo, não pelos métodos racionais e teóricos, balançar as estruturas da incredulidade e do ateísmo por meio de sua vida pratica e da enormidade de eventos somente possíveis pela presença de Deus, doutra forma muito dificilmente explicáveis? Onde estão aqueles que sabem discernir ou diferenciar aquilo que convém daquilo que não convém? Onde estão aqueles que vivem acima da Lei e das Regras Humanas (entendendo aqui que viver acima da Lei ou acima delas não seja sinônimo de desrespeitá-las ou ignorá-las, pelo contrário, tê-las de tal modo entranhadas que sejam um modo natural de viver porque ¨porei minha Lei em seus corações¨)? Quem serão aqueles que ainda respeitem uma condição tão básica da vida espiritual de ler as Escrituras e orar constantemente, sem cessar, sem parar, sem se cansar, sem desanimar, sem desistir? Onde estão aqueles que ainda tem tempo para os doentes, os pobres, os desprezados, os velhos, os encarcerados? Onde estão aqueles que se indignam contra as injustiças tão comuns em todos os tempos e se levantam firmes com respostas e soluções para elas? Cadê? Cadê? Cadê?
Ainda não perdi a esperança de encontra-los, até mantenho a esperança de poder conviver com os tais, quem sabe me tornar um deles. Mas já começo a achar mais fácil me encontrar com um Coelhinho que põe ovos, e ovos de chocolate. Quem sabe ainda não me encontro com a Mula sem Cabeça, ou qualquer outro bicho mais provável.
Pastor Junior Martins
Julho de 2013